A substância dos intangíveis
Nas últimas décadas nota-se uma mudança no foco das empresas de ativos tangíveis para intangíveis, sendo o capital intelectual o mais importante na criação de vantagens competitivas sustentáveis.
O conhecimento sempre foi uma forma de poder e, na segunda metade do século passado, ganhou relevância como componente de geração de riqueza. A relação do conhecimento e a geração de riqueza que nos referimos aqui não se limita ao campo das ideias revolucionárias ou aprofundamento científico de forma isolada. O conceito de riqueza está ligado ao valor econômico das ideias seguidas de iniciativas coordenadas.
O ritmo acelerado da globalização e especialização alteraram profundamente a relação de valor e conhecimento e, consequentemente, a natureza dos negócios e suas fronteiras. O resultado é um aumento extraordinário das interações entre indivíduos e organizações, exigindo adaptabilidade de empresas industriais e de serviços. Nesse sentido, o conhecimento tornou-se ferramenta imprescindível na construção e manutenção de vantagens competitivas sustentáveis.
Há algumas décadas, os ativos tangíveis funcionavam como plataforma para geração de fluxo de caixa e as primeiras empresas da era industrial tinham seu valor derivado principalmente de seus ativos físicos.
Esses gigantes corporativos, como General Motors e Standard Oil, possuíam edifícios, equipamentos e instalações que eram contabilizados por seus valores de aquisição e suportavam as avaliações de mercado dessas companhias. Hoje, ativos reais são frequentemente indesejáveis e representam um verdadeiro peso no orçamento de capital dessas companhias, especialmente em períodos de incerteza.
Na última metade do século passado, uma nova geração de empresas surgiu, com grande parte de seu valor baseado em seus ativos intangíveis. Esses ativos podem ser diversos, como a marca (Nike), patentes (como a Pfizer) ou expertise tecnológica (como a Microsoft). Também surgiram empresas que desenvolveram a habilidade de combinar diversos ativos intangíveis com extrema competência, potencializando ainda mais a sua capacidade diferenciar-se. Empresas como a Fedex(know-how de distribuição e marca) e a Apple (know-how tecnológico, diferenciação dos produtos e dos serviços pós-venda, além da marca evidentemente), possuem características difíceis de serem replicadas, em consequência da complexidade de suas estruturas e processos que suportam e incentivam o conhecimento e que, ao longo de suas histórias, tornaram-se parte da cultura enraizada dessas companhias.
Atualmente, observa-se por parte dos administradores de empresas que a gestão estratégica do capital intelectual deve ser o foco principal nos esforços para a criação e manutenção dessas vantagens competitivas difíceis de serem replicadas. O capital intelectual é o único ativo capaz de gerar conhecimento, fator fundamental para criação de valor.
Mas esse tipo de gestão estratégica não é fácil. Os velhos processos para se melhorar a eficiência nas fábricas ou nos escritórios não se aplicam a profissionais de alta performance. O desempenho de uma área de vendas, por exemplo, não pode ser medido apenas pela quantidade de visitas, propostas e contratos assinados. Essa abordagem pode comprometer a eficácia de vendedores-chave que necessitam de mais interações com os clientes para obter informações relevantes no fechamento de um negócio mais lucrativo.
Uma empresa, dependendo do setor e de sua estratégia, deverá ter em seu quadro mais ou menos pessoas com o perfil dinâmico e de alto desempenho. Uma empresa nunca terá 100% de seu quadro com profissionais de alta performance, pois esse tipo de profissional só se encaixa em posições onde é desafiado constantemente. Por exemplo, uma organização com foco em diferenciação deverá ter mais pessoas com esse perfil do que uma empresa com estratégia de liderança de custos.
No caso das empresas onde os executivos são os próprios acionistas, percebe-se que muitas vezes não possuem um sistema de gestão de capital intelectual adequado, ou por não terem necessidade de um sistema de informação gerencial, ou por não possuírem o tempo de dedicação necessário e acabam acumulando funções que deveriam ser desempenhadas por uma equipe de média gerência devidamente capacitada.
Nesse sentido, os esforços devem se direcionar à estruturação de uma equipe de gestão multidisciplinar, com profissionais engajados e motivados a desempenhar atividades como criação de produtos e serviços, melhoria de processos internos, interação com grupos internos e externos para garantir a concretização dos objetivos da empresa, gerir o planejamento financeiro, entre outras atividades complexas.
Empresas intangíveis intensivas x Empresas tangíveis intensivas – Uma comparação entre empresas da Bovespa
Uma pesquisa realizada em 2009 levantou diversos índices econômicos de avaliação de empresas com objetivo de comparar o retorno sobre investimentos entre empresas que focam em ativos intangíveis e empresas que focam em ativos tangíveis. Como demonstram os gráficos abaixo, ficam evidentes as vantagens que as empresas fortemente intangíveis detêm sobre as empresas com maior foco em ativos tangíveis.
Capital Intelectual e Fusões e Aquisições
Como qualquer ativo, o capital intelectual tem valor de mercado e pode ser adquirido. Como consequência disto, muitos dos processos de fusões e aquisições ocorrem motivados pela absorção de capital intelectual, sendo muitas vezes a maneira mais fácil e direta de se adquirir algum conhecimento desejável.
Em diversos casos, a equipe de gestão é o que mantém o negócio e suas vantagens competitivas, sendo possível, apesar da mudança de controle, manter as características e o modelo de negócio, além de aproveitar as sinergias que advém da absorção da estrutura da companhia. É possível dizer que em muitos processos de fusão ou aquisição, a manutenção da equipe de gestão é uma condição precedente à transação.
Fontes:
Trombetta, M. S. Grau de intangibilidade e o desempenho econômicos das empresas no mercado acionário brasileiro. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Administração. Trabalho de Conclusão de Curso. 2009
Damodaran, A. DealingwithIntangibles: ValuingBrandNames, FlexibilityandPatents. Stern SchoolofBusiness. 2006
Marcos Cordeiro é sócio da Camaya Partners